Motoristas de aplicativo enfrentam dificuldades para contribuir com o INSS

Motoristas de aplicativo enfrentam dificuldades para contribuir com o INSS

Categoria tem pelo menos um milhão de profissionais no país

O trabalho como motorista de aplicativo foi a solução para muitos brasileiros que enfrentam dificuldade para conseguir emprego. Há também maneiras de garantir a aposentadoria através desta atividade, mas nem todos os trabalhadores da categoria irão usufruir deste e de outros benefícios, já que muitos não contribuem com a Previdência. Existem pelo menos um milhão de motoristas de aplicativo no Brasil.

Primeiro, é preciso entender as modalidades de contribuição. Para contribuir como autônomo/contribuinte individual o motorista pode pagar mensalmente o INSS com base na alíquota específica que varia de 11% do salário mínimo ou 20% do salário mínimo até o teto do INSS, que em 2024 subiu para R$ 7.786,01, sendo que esse tipo de contribuição maior dá direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou a uma aposentadoria de maior valor.

Já quem opta por ser MEI (microempreendedor individual) basta se inscrever como “motorista de aplicativo independente”, categoria criada em 2019 e pagar uma taxa mensal fixa através do DAS (Documento de Arrecadação do Simples Nacional), no valor de 5% do salário mínimo, com acréscimo de R$ 5 de ISS, independente do faturamento que não pode ser maior do que R$ 81 mil por ano (média de R$ 6.750 por mês).

No entanto, muitos acabam não pagando este valor. O DIA conversou com o motorista de aplicativo Sílvio Fernandes, 49, de Itaúna, São Gonçalo, para entender os motivos. Ele, que é formado em administração de empresas, relata dificuldades.

”Estou há seis anos no transporte por aplicativos. Infelizmente não consegui me adaptar de tal maneira que eu consiga pagar essa contribuição, por mais que seja importantíssimo e me garanta alguns benefícios”, admitiu.

”Prezo pelo bom atendimento aos meus passageiros, sendo assim, procuro andar com a manutenção sempre em dia, o ar sempre ligado, o carro sempre limpo e fora as outras despesas que um carro pede, como combustível, troca de óleo constantes (que são parte da manutenção). Com as tarifas e os descontos dos aplicativos, fica difícil a gente assumir muitas responsabilidades, por mais que sejam necessárias”, completou.

Em contraste, a reportagem também conversou com Givanildo Bezerra, que mora em Raul Veiga, São Gonçalo. Ele, que é motorista de aplicativo desde 2018, contou que a contribuição é uma de suas principais prioridades.

”Pago o DAS do MEI. Isso me garante uma segurança caso eu fique doente, com o auxílio-doença, além de facilitar empréstimos e até redução do valor para compra de veículo. Ainda me ajuda para aposentadoria”, disse.

Há também que trabalha como motorista de aplicativo como forma de complementar a renda de outros empregos. É o caso de Marcelo Gomes, morador do Fonseca, em Niterói, que dirige para aplicativos há 7 anos. Ele conta que contribuía com o MEI enquanto era apenas motorista de aplicativo.

”Costumava contribuir com pagando o DAS do MEI, mas por conta da alta taxa da empresa por corrida, da gasolina cara e da insegurança em alguns lugares, voltei a trabalhar como CLT também. Agora contribuo apenas pelo meu trabalho fixo”, revelou.

Lideranças da categoria aconselham contribuição

Denis Moura, que é presidente da Associação de Motoristas por Aplicativo do Rio de Janeiro (Ampa-RJ), explica como a categoria lida com essa questão.

”A maioria dos motoristas por aplicativos não paga por dois motivos. O primeiro pelo fato de o faturamento ser muito baixo. O segundo é que os aplicativos não passam estabilidade para os motoristas, o que leva a uma sensação de informalidade. Sempre aconselho a contribuir, porque quando acontece algum problema, ele está sozinho. Os aplicativos não ajudam em nada. Recomendo pagar o DAS do MEI”, afirmou.

Leandro Xavier preside o Instituto Família Ponta a Ponta, entidade que nasceu como uma forma de representar a categoria. Ele foi mais um recomendar a contribuição.

”Acho de extrema importância a contribuição para sua própria proteção em caso da falta de suas condições físicas. O DAS é a garantia de que ele terá uma aposentadoria e, caso aconteça algum imprevisto com sua saúde, você também terá benefício”, defendeu.

”Alguns motoristas que estão na plataforma entram porque perderam seus empregos. Muitos têm idade acima de 45 anos e não conseguem com tanta facilidade voltar ao mercado tradicional, mas ele acha que logo terá seu emprego de volta e o trabalho em aplicativos será temporário. No entanto, a realidade não tem sido essa. Vejo passar os anos e o com várias mudanças nos setores empregatício, eles continuam sendo motoristas. Sem contribuir, eles ficam reféns, sem poder cuidar do seu futuro”, explica.

O DIA buscou contato com a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que representa empresas de transporte por aplicativo no país para saber se havia alguma recomendação aos motoristas. A organização informou que, apesar de não fazer nenhuma recomendação específica, discute uma forma de incluir os trabalhadores da categoria na Previdência.
E quem é motorista de aplicativo e também trabalha no regime CLT?

A advogada Jeanne Vargas, especialista em Direito Previdenciário, orienta os profissionais que dirigem como forma de complementação da renda. Ela frisa que a contribuição para o INSS é importante em qualquer situação.

”Todo trabalhador que tem renda através do trabalho é contribuinte obrigatório da Previdência. Pagar o INSS não é uma opção, mas um dever, ainda que ele tenha outro emprego de carteira assinada. São fontes de renda distintas: motorista de aplicativo e emprego de carteira assinada. Os salários de contribuição (MEI/autônomo) e do emprego de carteira assinada poderão ser somados e considerados no cálculo de benefícios do INSS, como, por exemplo, na aposentadoria”, garantiu a especialista.

Ela também lembra que a soma fica limitada ao salário teto do INSS. ”O motorista de aplicativo só fica desobrigado a pagar o INSS se o salário do emprego de carteira assinada para o teto do INSS, que em 2024 subiu para R$ 7.786,01”.

Consequências

Jeanne Vargas é mais uma a alertar para a contribuição. As consequências de não contribuir são não contar para aposentadoria e não ter condição de segurado perante o INSS.

”O INSS é um seguro, tem direito a benefícios quem paga a contribuição previdenciária. Imagine o motorista de aplicativa que sofre um acidente no trânsito e fica sem condições de trabalhar. Se ele nunca tiver contribuído para a Previdência, não terá direito ao benefício por incapacidade, que é o benefício pago pelo INSS aos segurados que não tem condições de trabalhar, enquanto eles estiverem cuidando da saúde e se recuperando. Ou até mesmo um pai de família que vem a falecer nunca tendo contribuído para o INSS. Esse pai não poderá deixar pensão por morte para os seus dependentes (esposa/companheiro/filhos)”, exemplificou.

Projeto para a regulamentação

Há uma expectativa de que um projeto de regulamentação seja assinado pelo governo e enviado para o Congresso Nacional ainda em janeiro. Segundo o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, o principal objetivo do governo ao mediar as negociações entre trabalhadores e empresas é garantir condições decentes de trabalho.

”Nós temos um salário mínimo vigente, e essa é a base número um de qualquer debate sobre mercado de trabalho. Não pode ter ninguém que chegou no final do mês, ficou à disposição de uma empresa e ganha menos que um salário mínimo. Isso é uma aberração econômica”, disse o ministro na segunda quinzena de dezembro.

Segundo ele, a base do acordo fechado entre trabalhadores e empresas prevê garantia à previdência e remuneração pelo valor hora trabalhado, além do pagamento mensal de fatores como desgaste do material do veículo e reposição de despesas.

No entanto, para Denis Moura, essa regulamentação não agrada à maioria dos motoristas. ”Justamente o que o motorista quer é a liberdade para trabalhar por mais de uma plataforma. A regulamentação não tem que se preocupar com direitos trabalhistas, ninguém entre para trabalhar com transporte por aplicativo pensando em direitos trabalhistas. Na parte da regulamentação, o MEI já nos satisfaz”, garantiu.

”A categoria entende que a regulamentação deveria falar sobre tarifa e taxa fixa. Enquanto a taxa for variável e o motorista só souber o percentual do valor da corrida que ganhou quando ela encerra, nenhum motorista vai levar nenhuma regulamentação a sério, porque é isso que atinge o motorista. Outra questão é a tarifa. Em algumas corridas, o motorista não ganha nem para botar um litro de combustível. Se não falar de tarifa, segurança e respeito ao motorista, nunca vai acontecer uma regulamentação que o motorista vai aceitar”, cobrou.

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