Trabalhadores que tiveram os contratos de trabalho suspensos temporariamente durante a pandemia da Covid-19 podem enfrentar problemas na hora de dar entrada na aposentadoria do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Isso porque, no período em que tiveram o vínculo trabalhista interrompido, a contribuição previdenciária não foi feita, e o tempo de serviço deixou de ser contabilizado.
A possibilidade de suspensão temporária do contrato de trabalho foi prevista — ao lado da redução de jornada e salário — numa Medida Provisória assinada pelo então presidente Jair Bolsonaro, em julho de 2020, na tentativa de evitar demissões no país em meio à pandemia. Nesse modelo, os trabalhadores de empresas que aderiram a uma das possibilidades receberam uma complementação de renda paga pelo governo federal.
O texto, depois convertido em lei, determinava que o chamado Programa Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm) duraria até o dia 31 de dezembro daquele ano, mas voltou a valer em 2021.
No caso da redução de jornada, o trabalhador continuava a contribuir para o INSS. Já quem teve o contrato suspenso, no entanto, ficou sem o recolhimento previdenciário, o que impacta no cálculo para aprovação da aposentadoria.
Foi o caso da auxiliar de serviços gerais Maria Bernadete da Silva, de 59 anos. Moradora de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, ela teria o tempo de contribuição necessário para dar entrada na aposentadoria em outubro do ano passado, mas por ter tido o contrato de trabalho suspenso por oito meses durante a pandemia, precisará trabalhar até maio para ter acesso ao benefício.
— Dei entrada na aposentadoria no dia 10 de outubro, pediram para aguardar 45 dias, e nada. Quando deu três meses, me informaram que o pedido não foi aceito porque eu tinha que trabalhar mais oito meses para dar entrada na aposentadoria de novo — conta.
A advogada previdenciária Jeanne Vargas, do escritório Vargas Farias Advocacia, alerta que os contribuintes precisam ficar atentos aos “buracos” no tempo de contribuição:
— Sem recolhimento de contribuição previdenciária não tem como contar o tempo de contribuição. O perigo é que muitos trabalhadores não se atentaram a isso na época da pandemia e acabaram contando esse tempo da suspensão como tempo para aposentadoria. Esse tempo poderia ter sido contado se, na época, eles tivessem contribuído para a Previdência como segurados facultativos.
Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), concorda. Ela explica que o impacto do não recolhimento previdenciário na liberação da aposentadoria acontece porque a lei que regulava a suspensão dos contratos determinava que a contribuição para o INSS era facultativa, ou seja, sem a possibilidade de pagamento retroativo.
— Esse trabalhador vai precisar trabalhar mais, não tem o que fazer. A lei determinava que, nesse período, a contribuição era facultativa, ou seja, não permitia o pagamento em atraso, retroativo. O jeito é o trabalhador recolher o tempo restante para cobrir o período em que o contrato estava suspenso e sem contribuição — explica a especialista: — O indicado era que, na época, esse contribuinte recolhesse algum percentual, mesmo que menor do que o desconto em folha, para que o tempo de serviço continuasse contando.
Jeanne também lembra que, antes de fazer o pedido de aposentadoria, o trabalhador deve verificar se há contribuições abaixo do salário mínimo e se houve meses sem contribuição por causa da suspensão do contrato na pandemia, via Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS):
— Nesse extrato, é possível identificar as contribuições abaixo do salário e pedir a complementação antes mesmo de fazer o pedido de aposentadoria ou no próprio requerimento.
A advogada lembra ainda que, mesmo que o segurado não tenha feito o pedido de complementação, o INSS deve verificar se o adicional é necessário para alcançar o tempo mínimo e “emitir uma exigência, oportunizando essa complementação”.
— Se o INSS nega o pedido de aposentadoria sem dar oportunidade de o segurado fazer essa complementação, o indeferimento ainda pode ser revertido em recurso ou pedido de revisão administrativo ou até mesmo através de uma ação judicial — analisa.
O problema é que a análise de um recurso pode demorar.
Redução de jornada teve contribuição
Trabalhadores que tiveram a jornada de trabalho reduzida continuaram tendo a contribuição ao INSS descontada. Mas, se o recolhimento tiver sido abaixo do salário mínimo da época – R$ 1.045, em 2020, e R$ 1.100, em 2021 –, o tempo de serviço não é contado normalmente. Adriana, do IBDP, explica:
— Se foi abaixo, tem que complementar via DARF (Documento de Arrecadação de Receitas Federais) no código 1872 no percentual de 7,5% da diferença que faltou para o salário mínimo.